Transformação digital e cultura de produto Como colocar a tecnologia no centro da estratégia de sua empresa
Joaquim TorresPrefácio, por Marty Cagan
Conheci o Joca em 2007. Tinha acabado de publicar a primeira edição do INSPIRED, e aquele livro começou a aumentar minha visibilidade além das fronteiras do Vale do Silício.
Joca era head de produto da então primeira scaleup que conheci no Brasil, a Locaweb.
A Locaweb era a empresa certa, com os produtos certos, no lugar certo, na hora certa, fornecendo grande parte da infraestrutura e serviços essenciais de produtividade para consumidores e empresas à medida que a América do Sul se tornava on-line rapidamente.
Logo percebi que a Locaweb tinha uma equipe de liderança forte e ansiosa para aprender a trabalhar como as melhores empresas do mundo.
Nos anos seguintes, observei o crescimento e o sucesso da Locaweb, e também passei a conhecer e admirar o Joca.
Como você pode imaginar, a experiência adquirida por Joca na Locaweb fez dele um líder de produto extremamente valioso, no centro da crescente indústria de tecnologia no Brasil. Ele foi capaz de ajudar a construir algumas das mais famosas empresas brasileiras de tecnologia, incluindo o Gympass, uma história brasileira de sucesso global.
Joca sempre foi muito consciente e cuidadoso com a arte de desenvolver produtos e, há vários anos, começou a compartilhar o que tem aprendido escrevendo para a comunidade brasileira.
O Brasil tem tanto talento e tanto potencial, mas não há pessoas suficientes com experiência real em liderança de produtos nas empresas. Por isso, há vários anos venho incentivando o Joca a considerar se tornar um coach de produto em tempo integral, para que ele possa ajudar o maior número possível de pessoas e empresas.
Estou muito feliz por ele ter decidido recentemente dar o salto para essa nova carreira. E este último livro compartilha muito do que ele tem aprendido ajudando as empresas a começarem a trabalhar como as melhores empresas de produto.
Além de conhecer como operam as melhores empresas de tecnologia, Joca também conhece o mercado brasileiro e a comunidade brasileira de tecnologia. Espero que muito mais empresas descubram o Joca e aproveitem o que ele tem a oferecer. Este livro certamente servirá como essa introdução.
Marty Cagan - Silicon Valley Product Group
Agosto de 2023
Sobre o livro
Apenas 7% das empresas têm times de liderança com experiência digital. Essa é uma das descobertas de um estudo feito por pesquisadores do CISR (Center for Information Systems Research) do MIT Sloan e publicado na edição de março de 2021 do MIT Sloan Management Review (WEILL et al., 2021). O estudo foi feito com quase 17 mil executivos de 1.984 grandes empresas globais. Entre as empresas estudadas, o tamanho médio da equipe de liderança é de 9 membros. No geral, apenas 17% dos membros dessas equipes são experientes digitalmente.
Ser digitalmente experiente significa ter uma compreensão, desenvolvida por meio da experiência e da educação, do impacto que as tecnologias emergentes têm no sucesso dos negócios.
Outras descobertas interessantes desse estudo:
- CIOs e CTOs são os executivos mais experientes digitalmente, mas apenas 45% são digitalmente experientes;
- Em termos de CEOs, COOs e heads de marketing, 23% deles são digitalmente experientes;
- Nos executivos de vendas e CFOs, apenas 12% têm conhecimento digital;
- Em termos de indústrias, no topo, com 30% de executivos com experiência digital, temos as indústrias de mídia, software e telecomunicações;
- Na base (1% de executivos com experiência digital): construção; artes, entretenimento e recreação; agricultura, silvicultura, pesca e caça;
- No meio (12% digitalmente experientes): finanças e seguros.
Por que isso importa?
De acordo com o estudo, ter um C-level digitalmente experiente impacta diretamente no resultado. Por exemplo, uma CEO com experiência digital junto com uma CFO com experiência digital que, em vez de atuar como um gatekeeper, pode ajudar a identificar quais investimentos digitais têm potencial para promover um desempenho inovador, estão associados a um aumento de 6,7 pontos percentuais (p.p.) no crescimento da receita.
Neste estudo, os autores compararam o desempenho das 25% melhores equipes de liderança digitalmente experientes com os 25% inferiores, e as diferenças são impressionantes:
25% das equipes de liderança com maior experiência digital | 25% das equipes de liderança com menor experiência digital | |
% da receita de novos produtos lançados nos últimos 3 anos | 59% | 18% |
% das receitas provenientes de cross-sell | 53% | 15% |
Mudança da orientação de comando e controle para uma orientação focada em colaboração e comunicação | 83% | 28% |
Ter as pessoas se sentindo responsáveis pelos resultados gerados | 85% | 41% |
Incentivo à inovação | 85% | 30% |
É claro o impacto que o uso dessa experiência digital pode ter nos resultados de uma empresa.
Transformação digital e gestão de produtos
A função de gestão de produtos, muito conhecida no mundo das startups e das empresas de tecnologia, tem por principal objetivo fazer a conexão entre a estratégia da empresa e os problemas e necessidades dos clientes por meio de tecnologias digitais. As pessoas de gestão de produtos são pessoas digitalmente experientes, com uma compreensão profunda, desenvolvida por meio de experiência e treinamento, do impacto que as tecnologias digitais têm no sucesso dos negócios.
A ideia de escrever um livro sobre transformação digital veio da minha experiência na liderança da transformação digital da Lopes Consultoria de Imóveis, empresa de consultoria imobiliária líder no mercado brasileiro de compra, venda e aluguel de imóveis em quantidade de transações imobiliárias.
A empresa foi fundada em 1935, realizou seu IPO em dezembro de 2006 na B3, a bolsa de valores brasileira sediada na cidade de São Paulo, e, em outubro de 2019, realizou um follow-on, que é a emissão de mais ações para serem negociadas no mercado de capitais, no montante de R$ 147 milhões, cujos recursos captados seriam focados na transformação digital da companhia.
Em meados de 2020, eu recebi o convite para liderar o Lopes Labs, hub de tecnologia e inovação da Lopes cuja missão é "Buscar o encontro ideal entre cliente, imóvel e corretor através do empoderamento digital de todas as partes: cliente final, corretor, franquias, proprietários e incorporadores".
Aceitei o convite motivado pela oportunidade de entender se meus aprendizados e minha experiência acumulados em quase 30 anos trabalhando em empresas de tecnologia poderiam ser úteis em uma empresa tradicional que estava buscando a transformação digital.
Liderei o Lopes Labs por 2 anos e não só confirmei a utilidade de minha experiência e aprendizados em uma transformação digital, como pude aprender muito sobre o tema. Inclusive, compreendi que aquela não era minha primeira experiência em uma transformação digital. Ao longo de minha carreira, passei por vários momentos que podem ser vistos como transformação digital.
O Gympass, apesar da aura de tech company que sempre teve, nem sempre usou o digital da melhor forma. Quando me juntei ao Gympass em meados de 2018, a empresa já tinha 800 funcionários, dos quais 150 na Europa, 150 nos Estados Unidos e o restante na América Latina, majoritariamente no Brasil. Contudo, apenas 35 pessoas compunham o time de desenvolvimento de produto, incluindo pessoas engenheiras, product designers, product managers e analistas de dados. Em função disso, a maioria dos processos eram manuais, e havia um time de operações de tamanho considerável para executar esses processos manuais.
A Locaweb é uma empresa que tem a tecnologia como o core de seus produtos. Seu primeiro produto foi a hospedagem de sites. Quando me juntei a eles em 2005, a empresa já tinha 7 anos, mas desenvolvíamos produtos do jeito antigo, usando o modelo cascata, também conhecido pelo termo em inglês "waterfall". Só em 2007 começamos a transformar a forma como fazíamos produto, sendo uma das primeiras empresas do Brasil a adotar metodologias ágeis e princípios de gestão de produto digital.
O que é transformação digital? Transformações costumam ser difíceis; então, o que motiva o desejo de uma empresa querer passar por isso? O que é necessário para aumentar as chances de sucesso de uma transformação digital? Como a transformação digital se aplica a diferentes tipos de empresas?
Esses são os temas de que vou tratar neste livro, compartilhando meus aprendizados na esperança de que eles sejam úteis para que mais pessoas possam conduzir processos de transformação digital bem-sucedidos.
Para quem é este livro
Todas as empresas já estão fazendo ou vão eventualmente fazer uso da tecnologia e de produtos digitais para melhorar o seu dia a dia, se aproximar mais de seus clientes e melhorar sua eficiência.
Este livro será útil para líderes dessas empresas que estão querendo extrair mais resultados de seus investimentos em transformação digital e, em especial, para as pessoas que tiverem a incumbência de planejar e executar essa transformação.
Qualquer transformação costuma requerer um alto esforço, principalmente quando envolve mudanças de comportamento. Neste livro falarei sobre as mudanças de comportamento necessárias para aumentar a maturidade digital de uma empresa, não só para as pessoas incumbidas de planejar e executar essa transformação, mas para todas as pessoas da empresa que planeja ou que está passando por uma transformação digital. Sendo assim, este livro poderá também ser útil para essas pessoas, uma vez que a transformação digital não acontece somente em uma área, mas em toda a empresa.
Transformação digital pode até ter um começo, mas não tem fim, uma vez que as tecnologias digitais estão em constante evolução. Por esse motivo, mesmo pessoas que trabalham em empresas maduras digitalmente poderão se beneficiar da leitura deste livro, revendo conceitos com um novo olhar para avaliar se a empresa consegue tirar ainda mais proveito dessas tecnologias.
Estrutura do livro
O livro está dividido em quatro partes principais:
1. Conceitos: quem me conhece sabe que sou um grande fã de iniciar qualquer novo empreendimento com uma linguagem ubíqua (ubiquitous language), termo que Eric Evans usa no seu livro "Domain-Driven Design" para a prática de criar uma linguagem comum e rigorosa entre desenvolvedores e usuários — no meu caso, entre autor e leitores(as). Por esse motivo, começarei o livro definindo alguns conceitos importantes para transformações digitais bem-sucedidas. Começo definindo o próprio termo "transformação digital" em conjunto com "gestão de produtos digitais". Como veremos, esses dois conceitos têm muita correlação. Em seguida, falo sobre incerteza e transformação digital, tipos de empresa, maturidade digital, modelos de negócio, plataforma, marketplace e cultura de produto digital.
2. Princípios: nessa parte, vou falar de cultura de produto digital e vou apresentar os quatro princípios que são as bases de comportamento necessárias para aumentar as chances de sucesso de uma transformação digital. Não vou fazer segredo e já vou apresentar esses quatro princípios aqui mesmo, mas recomendo a leitura dos capítulos dessa parte, pois, além de explicar em detalhes o que são esses princípios, estão repletos de exemplos práticos de sua aplicação no dia a dia. Então, sem maiores delongas, os princípios são: (1) entregas rápidas e frequentes; (2) foco no problema; (3) entrega de resultado e (4) mentalidade de ecossistema.
3. Ferramentas: aqui vou apresentar várias ferramentas que eu utilizei ao longo de minha carreira e continuo usando para ajudar as empresas com quem eu interajo a conectarem negócio e tecnologia e a tirarem mais resultados de seus investimentos em tecnologias digitais. Maturidade digital, visão de produto, objetivos estratégicos, estrutura de time e OKRs são algumas das ferramentas que vou cobrir nessa parte. Também vou compartilhar alguns hacks que tenho utilizado para ajudar a disseminar a cultura de produto digital nas empresas. Também falarei de duas ferramentas que, se bem utilizadas, podem ser poderosas vantagens para as incumbentes sobre as startups.
4. Pessoas: depois de conhecermos os conceitos, os princípios e as ferramentas, precisamos falar das pessoas, que utilizarão isso tudo para fazer acontecer a jornada de transformação digital.
Cada capítulo tem, em seu final, uma seção Resumindo, que tem por objetivo ser um guia rápido sobre o conteúdo daquele capítulo para ajudar você a revisá-lo rapidamente antes de seguir em frente.
Uma novidade neste livro em relação aos meus livros anteriores são as seções Recomendação no final de cada capítulo. Elas têm por objetivo ressaltar alguns aspectos importantes do capítulo a serem considerados por pessoas que têm pouca experiência com o uso de tecnologias digitais no dia a dia da empresa.
Antes de começar o livro, quero contar um pouco sobre minha história e minha experiência com transformações digitais.
Quem é essa pessoa para falar de Transformação Digital?
Acho a sua pergunta bastante pertinente e apropriada; por isso, aqui vai um pequeno histórico. Acredito que minha experiência com gestão de produtos digitais e, consequentemente, com a transformação causada por esses produtos digitais, vem da época das primeiras linhas de código que escrevi, em meados da década de 1980. Desde aqueles primeiros programas de computador, eu já via o potencial do que chamávamos na época de software — e que hoje chamamos de "produtos digitais" — de mudar a forma como as pessoas interagiam entre si e com as empresas.
No final de 1992, quando estava terminando a graduação em engenharia da computação no ITA, considerada por muitos a melhor faculdade de engenharia do Brasil, um tio meu me falou que ele conheceu um negócio muito bacana de computadores chamado BBS (Bulletin Board System). Ele não entendia nada de computadores, mas disse que tinha algo a ver com redes e que, se eu achasse interessante, nós podíamos abrir um negócio juntos. Com mais dois sócios, meu tio e eu criamos a Dialdata BBS, que, em 1995, foi renomeada para Dialdata Internet, um dos primeiros provedores de acesso à internet do Brasil.
Durante esses anos na Dialdata, escrevi muitas linhas de código, produtos digitais que eram disponibilizados para os usuários da BBS usarem. Também escrevi o sistema de cobrança, utilizado pelos funcionários da Dialdata para fazer a cobrança dos clientes. A interação com usuários internos e externos me ensinou muito sobre desenvolvimento de produtos digitais. Não basta só ter uma ideia na cabeça e um computador na mão para sair criando o produto. É preciso entender o que o usuário espera do produto e o que você e sua empresa planejam obter com ele. Este é um dos primeiros passos de qualquer transformação digital: ter a clareza do que a empresa espera obter com o uso da tecnologia.
Em 1998, a Dialdata foi vendida para uma empresa americana chamada VIA NET.WORKS, que estava comprando provedores de serviços de internet em vários lugares do mundo para criar um provedor global de serviços de internet para fazer um IPO (Initial Public Offering, ou oferta pública inicial de ações em uma bolsa de valores). Nessa época, fui convidado para trabalhar com gestão de produtos na VIA NET.WORKS.
Foi a primeira vez que tive contato com o termo e a função de gestão de produtos. Minha responsabilidade era criar um portfólio global de produtos a partir das diferentes ofertas de produtos das empresas que foram adquiridas pela VIA NET.WORKS em 10 países da América Latina, nos EUA e na Europa. Foi aí que comecei a entender a importância desse papel em empresas de tecnologia em geral, especificamente nas empresas de produtos digitais. Entendi o quão desafiadora é a liderança matricial, uma vez que eu tinha por missão criar esse portfólio global de produtos e, para fazer isso, não tinha ninguém em minha equipe e eu precisava contar com os times de produto locais, que tinham seus objetivos locais.
Em 2005, Gilberto Mautner, que também estudou no ITA, me convidou para ajudá-lo a melhorar o processo de desenvolvimento de produtos na empresa dele, a Locaweb, líder no Brasil em hospedagem de sites. Uma das principais preocupações dele, que passou a ser minha preocupação também, era que 100% da receita da Locaweb vinha da hospedagem de sites. Contudo, naquela época estavam aparecendo muitos hospedeiros gratuitos — como o HPG, sigla que significa Home Page Grátis —, que permitiam que qualquer pessoa criasse sites de maneira simples. Esta virou minha missão na Locaweb: a diversificação do portfólio de produtos para que conseguíssemos diminuir a dependência da receita proveniente do produto de hospedagem de sites.
Quando saí da Locaweb em 2016, tínhamos um portfólio de mais de 30 produtos, e menos de 65% da receita da empresa advinha da hospedagem de sites. O time completo de desenvolvimento de produtos — incluindo gestoras de produtos, designers de UX e engenheiras de software — contava com mais de 100 pessoas. Aprendemos muito ao longo desses anos, do waterfall para as metodologias e cultura ágeis, gestão de produtos, gestão participativa e OKRs — entre vários outros conceitos que foram experimentados como parte desse aprendizado.
Em 2012, conheci o Vinicius Roveda, um dos fundadores e CEO da Conta Azul, empresa que ainda estava dando os seus primeiros passos. A ideia era a Locaweb e a Conta Azul terem algum tipo de parceria para oferecermos a solução de ERP da Conta Azul para os clientes da Locaweb. Na época, a parceria não vingou, mas Vinicius e eu conversamos algumas vezes sobre gestão e desenvolvimento de produtos, e desde aquela época já era evidente a afinidade que tínhamos sobre esses temas.
Ao longo de 2016, voltamos a conversar e começamos a explorar a possibilidade de eu me juntar ao time da Conta Azul. A empresa já tinha 5 anos e estava escalando a uma velocidade incrível. Por esse motivo, o Vinicius estava buscando pessoas que já tivessem passado por isso em outras empresas e pudessem ajudar o time da Conta Azul a escalar de forma sustentável, mantendo a alta velocidade de crescimento. Topei o desafio e fui para a Conta Azul para liderar um time de 60 pessoas, que cresceu para 120 pessoas, sempre aprendendo muito!
A Conta Azul está localizada em Joinville, a maior cidade de Santa Catarina, um estado da região Sul do Brasil, então me mudei com minha família para lá. O que aprendi em 11,5 anos na Locaweb, apliquei em 2 anos na Conta Azul. Visão de produto, estratégia e estrutura de time foram temas que eu já tinha trabalhado na Locaweb, mas que a Conta Azul me proporcionou um ambiente bastante propício para que eu pudesse aprofundar meu conhecimento e prática dessas ferramentas muito úteis em transformações digitais.
Em 2018, alguns problemas familiares trouxeram minha família e eu de volta para São Paulo. Comecei a contatar algumas empresas e percebi uma demanda muita alta por head de produto. Uma dessas empresas era o Gympass, um marketplace de três lados que conecta academias a empresas e seus funcionários. No Gympass, liderei a equipe de desenvolvimento de produtos, juntamente com Rodrigo Rodrigues e Claudio Franco. Tivemos o desafio de criar um produto global usado por academias parceiras, empresas e seus funcionários em vários países. Como o Gympass é líder nesta categoria, tivemos o desafio adicional de sermos os primeiros a enfrentar certos problemas, o que é bastante empolgante. Expandimos um time de 30 pessoas para um time de 250 pessoas em 18 meses. Foi uma experiência incrível.
No segundo semestre de 2019, topei um novo desafio, o de criar não só um novo produto, mas uma nova unidade de negócios, o Gympass Wellness, na qual conectávamos aplicativos de bem-estar (workout, nutrição, meditação, terapia online etc.) ao nosso marketplace para oferecer uma solução completa de bem-estar para nossos clientes e seus funcionários. O Gympass Wellness tornou-se peça-chave em nossa estratégia durante a crise da COVID-19. Liderar o Gympass Wellness me deu a oportunidade de entender melhor o papel da gerência geral, de ter a responsabilidade por todas as áreas do negócio, não só a parte de desenvolvimento de produtos digitais.
Durante quase toda a minha carreira trabalhei com produtos digitais em empresas nas quais a tecnologia era o produto. A exceção ficou por conta do Gympass, onde o produto é um benefício corporativo de acesso a academias e estúdios, e o produto digital é uma ferramenta que ajuda na entrega desse produto principal. Mesmo assim, o Gympass sempre foi visto como uma startup de tecnologia. E, devido à crise da COVID-19, aceleramos a diversificação e digitalização de nosso portfólio de produtos:
- Acesso a academias e estúdios: mais de 50 mil academias e estúdios em 14 países;
- Aulas ao vivo: para quem gosta de treinar em grupo ou quer reviver o sentimento de classe com colegas de academia;
- Personal trainers: para quem prefere uma abordagem mais personalizada e gosta de se exercitar no seu tempo;
- Gympass Wellness: pacote de aplicativos com mais de 80 apps para quem procura por opções para melhorar o bem-estar físico e mental (da nutrição à sessão de terapia).
Foi uma experiência muito bacana poder ajudar uma empresa que não tinha a tecnologia como seu core a poder inovar e se digitalizar criando produtos digitais para atingir seus objetivos estratégicos e para resolver problemas e atender a necessidades de seus clientes e parceiros.
Contudo, ainda estava faltando uma experiência na minha carreira. Sempre acreditei no poder da tecnologia para ajudar empresas a atingirem seus objetivos e ajudarem a servir ainda melhor seus clientes, mas nunca tive a oportunidade de trabalhar em uma empresa tradicional e ajudá-la a criar e implementar uma estratégia digital. Tenho acompanhado casos famosos de transformação digital como o do Banco Itaú e da Magazine Luiza, que, pelo menos de fora, com a visão de cliente que sou de ambas as empresas, me chamaram a atenção por estarem conseguindo usar a tecnologia para potencializar o negócio.
No segundo semestre de 2020, recebi e aceitei o convite para liderar a estratégia digital da maior imobiliária do país, a Lopes Consultoria de Imóveis, com um time de mais de 100 pessoas, onde liderei não só o desenvolvimento de produtos digitais como também as áreas de marketing e vendas digitais, me proporcionando mais uma experiência de gestão geral e de muito aprendizado.
Após 2 anos de muito aprendizado e excelentes resultados na Lopes, decidi fazer uma mudança de carreira. Desde meados de 2022 tenho usado minha experiência de mais 30 anos como executivo full-time liderando equipes de tecnologia e desenvolvimento de produtos digitais para ajudar mais empresas e pessoas a conectarem tecnologia e negócios por meio de treinamento e consultoria em gestão de produtos e transformação digital. Voltei a ser empreendedor! \o/
Qual é o seu propósito?
Li um livro intitulado "Como avaliar sua vida" ("How will you measure your life?"), do Prof. Clayton Christensen, que lecionava em Harvard e foi criador do conceito "inovação disruptiva". Nesse livro, publicado em 2012, ele conta como percebeu que, ao longo dos anos, seus colegas de turma acabaram se tornando pessoas infelizes, com suas vidas pessoais e profissionais distantes da que haviam planejado na época da faculdade. Alguns tinham seus nomes atrelados a escândalos financeiros e fiscais. Outros se casaram, separaram e brigam judicialmente com ex-cônjuges. Outros ainda mal conseguem acompanhar o crescimento dos filhos.
Essa constatação o fez refletir sobre como seria possível aumentar as chances de encontrar satisfação e felicidade ao longo da vida. No livro, ele propõe que uma forma de se fazer isso é aplicando algumas das ferramentas do mundo da administração de empresas à gestão da vida pessoal e profissional.
Uma dessas ferramentas é o propósito. O propósito empresarial é o motivo de existir de uma determinada empresa. Muitas publicam esse motivo de forma clara. O Google tem por propósito organizar toda a informação do mundo e fazê-la universalmente acessível e útil. A Nike quer trazer inspiração e inovação para todos os atletas do mundo, e que, se você tem um corpo, você também é um atleta. Na Conta Azul, impulsionamos o sucesso do pequeno empreendedor e, no Gympass, combatemos o sedentarismo.
O Prof. Christensen propõe que as pessoas também tenham um propósito que deve nortear suas decisões ao longo da vida, da mesma forma que as empresas devem ter um propósito que as norteie. Achei essa ideia bem interessante e ela me provocou a pensar no meu propósito. Após analisar como invisto meu tempo e no que tenho prazer e satisfação em trabalhar, acabei definindo o meu propósito.
MEU PROPÓSITO: Ajudar as pessoas a criarem produtos digitais melhores.
Por isso, já escrevi 3 livros sobre desenvolvimento de produtos digitais, compartilhando minha experiência e meus aprendizados. São eles:
- Guia da startup: Como startups e empresas estabelecidas podem criar produtos de software rentáveis: nesse livro, conto sobre o processo de descobrir e desenvolver um produto que resolve um problema ou atende às necessidades de um conjunto de pessoas e que, ao mesmo tempo, é capaz de gerar retorno para quem desenvolve o produto. É um livro focado em discovery, em como descobrir e desenvolver o produto certo. Trago também algumas entrevistas com fundadores de algumas startups.
- Gestão de produtos: Como aumentar as chances de sucesso do seu software: o tema desse livro é a função de gestão de produtos, que conecta os objetivos estratégicos da empresa com os problemas e necessidades do cliente por meio de tecnologia. Nesse livro, conto quais são as responsabilidades e características de uma pessoa gestora de produtos, como é o ciclo de vida de um produto digital, como uma pessoa gestora de produtos deve se relacionar com as demais áreas da empresa e como fazer gestão de portfólio de produtos.
- Liderança de produtos digitais: A ciência e a arte da gestão de times de produto: aqui, o foco é na liderança de times de desenvolvimento de produtos. Visão, estratégia, estrutura de time, princípios, cultura de produto, produtividade, qualidade, métricas, cerimônias, contratação e avaliação de desempenho são alguns dos temas que abordo nesse livro.
Mesmo tendo escrito esses 3 livros, resolvi escrever mais um especificamente sobre transformação digital, para poder compartilhar meus aprendizados e experiências mais recentes ao ajudar empresas que não tinham a tecnologia como core a extraírem valor e resultado de seus investimentos em produtos digitais.
Acredito que o que vou compartilhar poderá ajudar não só na criação de produtos digitais melhores, como também poderá ajudar as empresas a desenharem e executarem estratégias de transformação digital com boas chances de sucesso.
Sei que ainda tenho muito a aprender e quero continuar aprendendo sempre. Como o aprendizado vem da troca de experiências e da conversa, convido você a compartilhar suas experiências lá no meu perfil do LinkedIn (https://www.linkedin.com/in/jocatorres) ou via e-mail (jtorres@jig.com.br).
Vamos começar?
Sumário
- Parte 1: Conceitos
- 1 A tal da transformação digital
- 1.1 Projeto e produto
- 2 Incerteza e transformação digital
- 2.1 O impacto da incerteza em diferentes indústrias
- 2.2 A transformação digital é mais sobre transformação do que sobre digital
- 2.3 Pessoas têm experiências prévias diferentes
- 3 Tipo de empresa
- 3.1 Empresas digitais
- 3.2 Empresas tradicionais
- 3.3 O terceiro tipo de empresa: empresas tradicionais nativas digitais
- 4 Tipo de empresa x maturidade digital
- 4.1 Maturidade digital é um conceito que se aplica apenas a empresas tradicionais?
- 4.2 Matriz natureza da empresa versus maturidade digital
- 4.3 Como melhorar a maturidade digital da sua empresa?
- 5 Modelos de negócio
- 5.1 B2C e B2B
- 5.2 Plataformas
- 5.3 Marketplaces
- 6 Cultura ágil, digital e de produto
- 6.1 Cultura ágil
- 6.2 Cultura digital ou cultura de produto
- 6.3 Juntando tudo
- Parte 2: Princípios
- 7 Entregas rápidas e frequentes
- 7.1 Por que é preciso passar vergonha?
- 7.2 Gympass Wellness
- 7.3 Medindo e gerenciando a produtividade
- 7.4 E a qualidade?
- 7.5 Estudo de caso: Grupo Dasa
- 7.6 Estudo de caso: Itaú Unibanco
- 8 Foco no problema
- 8.1 O famoso discovery de produto
- 8.2 Por que o modelo "pessoas de negócios demandam -> pessoas de tecnologia implementam" não funciona
- 8.3 Estudo de caso: Magazine Luiza
- 9 Entrega de resultado
- 9.1 Vamos tirar o produto do centro?
- 9.2 Time terceirizado ou time interno?
- 9.3 Prioridade número um do time de desenvolvimento de produto
- 9.4 Estudo de caso: Centauro
- 10 Mentalidade de ecossistema
- 10.1 Diversificando – e digitalizando – um portfólio de produtos
- 10.2 Usando a mentalidade de ecossistema em qualquer empresa
- 10.3 Estudo de caso: Tok&Stok
- Parte 3: Ferramentas
- 11 Visão de produto
- 11.1 Exemplos de visão do produto
- 11.2 Sugestão de processo para criação da visão de produto
- 12 Estratégia de produto
- 12.1 Análise de mercado
- 12.2 Análise SWOT
- 12.3 Definindo a estratégia
- 12.4 Exemplo: Gyaco
- 13 Estrutura de time
- 13.1 Estrutura básica
- 13.2 Times de produto
- 13.3 Times estruturais
- 13.4 Tópicos avançados
- 14 OKRs
- 14.1 Alguns cuidados
- 14.2 De onde vêm os OKRs?
- 14.3 Escalando OKRs
- 15 Medindo a maturidade digital
- 15.1 Como medir a maturidade digital de uma empresa?
- 15.2 Exemplos da vida real
- 16 Hacks para ajudar na jornada de transformação digital
- 16.1 Hack 1: Começar pequeno
- 16.2 Hack 2: Terminologia alfa, beta e Go-live
- 16.3 Hack 3: Qual é o problema?
- 16.4 Hack 4: Exemplos
- 16.5 Hack 5: Digital e business drops
- 16.6 Hack 6: Showcase
- 16.7 Hack 7: Produtizando exceções
- 17 Ferramentas que são potenciais pontos fortes das incumbentes
- 17.1 Primeira ferramenta: Dados
- 17.2 Segunda ferramenta: Conhecimento do domínio
- Parte 4: Pessoas
- 18 Conclusão: é tudo sobre pessoas
- 18.1 Está faltando mais um elemento
- 18.2 Tudo pronto, vamos começar?
- 19 Referências
Dados do produto
- Número de páginas:
- 338
- ISBN:
- 978-85-5519-353-8
- Data publicação:
- 11/2023