Prefácio por Joca Torres

Em 2006, na Locaweb, tínhamos cinco produtos: a Hospedagem de Sites, o Email, a Revenda de Hospedagem de Sites, o Servidor Dedicado e estávamos lançando o Construtor de Sites. Todos os produtos ligados e derivados do produto original da Locaweb.

O ponto em comum de todos esses produtos é que em todos havia a necessidade de enviar emails. No produto de Email essa necessidade é óbvia. Nos outros produtos, todos eles estão relacionados a sites que, em alguns casos, podem necessitar enviar algum tipo de email (confirmação de login, recuperação de senha, detalhes do pedido etc.). Contudo, como em cada produto estávamos usando uma tecnologia diferente, em cada produto usávamos uma solução diferente para envio de emails.

Por volta de 2010 nos demos conta disso e pensamos que deveríamos ter uma única solução de envio de email que servisse para todos os produtos. Depois começamos a perceber que nossos produtos tinham vários outros "pedaços" que eram comuns. Autenticação e autorização, API, infraestrutura de deploy. Foi aí que percebemos a necessidade de criar um time que iria cuidar desses "pedaços" comuns dos produtos. Chamamos esse time de Foundation, e ele era formado somente por pessoas engenheiras. Depois de mais um ano com esse time rodando só com pessoas engenheiras, percebemos que precisávamos de um olhar de gestão de produto, para conectar o trabalho desse time com as necessidades dos outros times, com os problemas dos clientes e com os objetivos estratégicos da Locaweb.

Tudo isso para contar que levamos uns 6 anos para perceber e resolver algo que, se tivéssemos o livro que você tem em mãos agora, resolveríamos em questão de semanas. A Sheila, que trabalha com produtos digitais há mais de 20 anos, desde maio de 2021, passou a cuidar dos produtos que eram "pedaços" comuns dentro do iFood. Dentre os produtos que ela cuidou está a plataforma de pedidos, um "pedaço" comum a mais de 100 aplicações. O que chamei aqui de "pedaço" comum tem o nome de plataforma, mais especificamente "plataforma de produto", como a Sheila bem explica no capítulo 1, "O que é plataforma, afinal?", uma vez que plataforma é um termo bastante genérico e pode significar várias coisas. E, com as plataformas de produto, nasce o papel da pessoa "Product Manager de plataforma", que também pode ser "Technical Product Manager" ou "API Product Manager".

Se você é uma pessoa Product Manager que se deparou com a necessidade de gerir um produto de plataforma, ou se você está em um time de plataforma sem Product Manager e está querendo entender como fazer com que o trabalho do time esteja mais alinhado com as necessidades dos outros times e, consequentemente, da empresa e dos clientes, ou ainda, se você tem mais de um time de desenvolvimento de produto e está começando a observar uma certa duplicação em algumas coisas que esses times estão fazendo, então está na hora de você se aprofundar no tema de gestão de plataformas de produto, e a Sheila é a melhor guia para isso. Não só pela sua experiência em uma das maiores empresas de tecnologia do Brasil e, provavelmente, do mundo, como também pela sua capacidade de organizar seus aprendizados neste livro.

Ela vai falar sobre conceitos, ciclo de vida, estrutura de time, valor da plataforma para stakeholders, incluindo os stakeholders não técnicos, qual estratégia aplicar, que métricas acompanhar, discovery, ideação de hipóteses de solução, prototipação, teste de usabilidade, ou seja, como aplicar vários conceitos, princípios e ferramentas comuns da gestão de produtos que são customer-facing nesses produtos de plataforma, produtos utilizados pelos outros times de produtos para reduzir seu time-to-market, seus riscos e seus custos.

Enfim, aqui você vai encontrar tudo o que você precisa para estar pronto ou pronta para rodar com produtos de plataforma em poucas semanas, tendo a Sheila como guia, em vez de ter que investir meses ou anos no método de tentativa-e-erro, como foi o meu caso tentando aprender isso tudo por conta própria! Aproveite!!!

Joca Torres

Gestão de plataforma, você sabe como fazer?

Se sua resposta foi NÃO, é bem provável que você esteja passando pelo mesmo que eu passei.

Quando comecei a trabalhar com plataforma de produtos no iFood, pensei: por que me contrataram para gestão desse produto?

Na entrevista, eu disse que eu queria trabalhar com produtos “técnicos", como os que eu usava, Google Analytics, Shortcut (chamava Clubhouse), Productboard. Falei que eu gostaria de trabalhar na experiência do dev (DX) e mencionei o Jira, GitHub e GitLab. Fui contratada para fazer gestão do tal produto "técnico". Só teve um probleminha! A plataforma para a qual fui contratada para fazer a gestão estava longe, infinitamente distante, do que o que passou pela minha cabeça na entrevista, quando ouvi o termo “plataforma”. Nos primeiros dias, descobri que envolvia experiência do dev, mas era mais “técnico” do que imaginei, eram APIs.

Eu já trabalhava com produtos digitais havia mais de 20 anos, tinha atuado em diferentes setores e etapas do funil — financeiro, e-commerce, marketplace; aquisição, ativação, retenção e monetização. Devido a isso, a expectativa sobre meu trabalho era altíssima.

Já minha percepção era de que todo meu repertório, acumulado ao longo de anos, era inútil para este tipo de produto. Claro que me desesperei e me lembro de, pelo menos, cinco momentos em que eu quis desistir. Primeiro, expressei ao head de produto o quão inútil era meu conhecimento para esse tipo produto. Então, ele indicou o que eu deveria estudar de plataforma e a confiança de que eu conseguiria — nas palavras dele, “você é a pessoa certa para esse produto”.

Como eu já estava lá, resolvi encarar. Para isso, tive que estudar muito — e rápido!

Nos primeiros três meses, trabalhei no Faster, uma plataforma puramente de APIs. Achei difícil, duas vezes pensei em desistir, mas depois que entendi bem o produto, os usuários e necessidades deles, até que ficou tranquilo. Visão do produto e o planejamento do ciclo bem definidos, com discovery sólido e fluxo de delivery indo bem.

Fui convidada para fazer a gestão da Order Platform, a plataforma que processa os pedidos. Ela é o coração do iFood, no centro do ecossistema. Nela, o pedido é criado, tem os status atualizados ao longo do seu ciclo de vida e os dados são propagados a todos os serviços interessados. Há mais de 100 aplicações integradas a ela. A essas aplicações integram-se tantas outras que nem temos noção do tamanho da rede que formam, o que provavelmente faz da Order Platform a mais complexa plataforma do iFood.

Comecei a trabalhar nessa plataforma bem na época de planejamento para o próximo ciclo. Mas como planejar algo que eu nem conhecia? Para agravar a situação, eu fui a primeira PM do time. Nas dailies, era uma sucessão de termos que eu nunca tinha escutado. Eu não entendia nada! Por três vezes, pensei em desistir.

Ainda bem que continuei. O esforço me trouxe uma satisfação inigualável. Hoje, posso dizer que, de todos os produtos em que trabalhei, este foi o mais difícil, o que mais amei e o que mais me orgulha. Os resultados ficaram evidentes: time alinhado aos objetivos, sabia o que fazer no ciclo, valor aderente à estratégia do negócio e apoio da alta gestão.

Para quem é o livro

Se você é Product Manager e migrou recentemente da gestão de produto customer-facing (voltado para o usuário final) para plataforma e está perdido(a), este livro vai ajudar você nessa transição. Também ajudará se você quer aprender sobre gestão de plataforma para abrir-se a um leque maior de oportunidades de trabalho como PM, este livro traz luz sobre os desafios que você vai encontrar e você será capaz de encarar uma nova oportunidade, dentro ou fora da empresa em que você trabalha.

Este livro é para pessoas que já atuam como Product Manager e que já têm algum domínio de técnicas de discovery, delivery e lançamento, mas devido ao fato de a plataforma se tratar de um produto técnico, estão com dificuldades de fazer a gestão — ou não sabem por onde começar e o que precisam aprender sobre o assunto.

Embora seja impossível falar de plataforma sem aprofundar em abordagens técnicas, este livro não se destina às pessoas de engenharia, que desenvolvem ou consomem APIs, tampouco ajudará em decisões técnicas dessa área.

O que você vai encontrar neste livro

Se você faz gestão de plataforma, já deve ter se perguntado:

- Qual valor que plataforma entrega? Como provar o valor aos stakeholders de negócio?

- Quais são as métricas de sucesso? Como conectar aos objetivos do negócio?

- Como priorizar diante de tantas demandas de diferentes stakeholders?

- Como lidar com a dependência entre produtos e times?

- Como fazer discovery?

- O que é preciso saber sobre a tecnologia?

- Como definir o domínio: até onde o produto vai e depois disso é responsabilidade de outro produto?

Neste livro, você encontrará respostas para essas e outras perguntas. Verá que a base dos conceitos de gestão de produtos é aplicável a qualquer tipo de produto: xampu, carro ou produto digital, inclusive, plataforma.

Minha teoria é de que precisamos compreender as características inerentes para a existência do produto e o que cada estágio do ciclo de vida do produto exige de estratégia e tático.

Com isso em mente é que consegui (junto com o time, óbvio!) lançar a nova Order Plataform. Por esse motivo, recebi a “demanda” de compartilhar dentro do iFood meu conhecimento e como apliquei práticas comuns de gestão de produtos na gestão de plataforma, o que me deu a ideia de ir além, escrever um livro.

A ideia se materializou neste livro que você tem em mãos. Ele dá uma visão completa do processo, teoria e prática, para planejar, elaborar o design e gerenciar o desenvolvimento de plataforma, desde o valor até o suporte ao desenvolvedor, seja para uma nova plataforma ou melhorias de uma existente.

Parte 1 — Fundamentos para gestão de plataforma e API como produto

Você verá o lado técnico, as características de uma plataforma (microsserviços, backend e API síncrona e assíncrona); o papel de cada profissional do time, incluindo Designer de API, um papel pouco difundido, e o que Platform Product Managers devem procurar fazer nos primeiros 90 dias. Além disso, o ciclo de vida da gestão de plataforma e o que devemos nos atentar em cada estágio, que são mais explorados ao longo do livro.

Parte 2 — Estratégia para plataforma e API

De posse dos fundamentos, a segunda parte apresenta o geral da estratégia, com as etapas que você precisa seguir para iniciar a criação de uma plataforma, que abrange o valor, métricas de sucesso e compreensão dos casos de uso. Ao término da parte 2, você conseguirá definir a estratégia da plataforma, usando o Lean Canvas, que adaptei para plataforma.

Parte 3 — Discovery de plataforma e API

Depois da estratégia, é hora de validar as hipóteses enumeradas no Lean Canvas. Você saberá como se beneficiar do Design Thinking para criar uma plataforma centrada nos usuários e como utilizei ferramentas conhecidas nas práticas de produto, como Matriz CSD, User Story Mapping, Wireframe. Você vai conhecer conceitos e boas práticas de design API REST, como testar, criar protótipo e aplicar teste de usabilidade.

Parte 4 — Depois do discovery

Para encerrar a jornada, vem um apanhado geral das etapas seguintes — Delivery, Lançamento e Monitoramento — e reflexões acerca dos desafios de Platform Product Managers, porque esses desafios ocorrem e como você pode lidar com eles.

Depois de aprender o necessário para a gestão de um produto tão técnico, você sentirá mais segurança nas suas decisões e saberá o que fazer, como fazer e quando fazer.